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sábado, 21 de maio de 2011

Terra Paulista

Território chamado Paulistânia em 1790


- Final -

O primitivo isolamento da comunidade paulista fez enraizar
uma forte mentalidade regionalista

  Sorocaba, a capital do tropeirismo, situava-se em posição privilegiada como rota de saída e entroncamento estratégico. A noroeste estava Goiás e Mato Grosso, ao norte, Minas Gerais, passando por São Paulo e Vale do Paraíba, sendo também rumo ao Rio de Janeiro.

  O resultado dos três movimentos – bandeirantismo, monções e tropeirismo – foi a colonização de um território conhecido por algum tempo como Paulistânia, abrangendo parte expressiva do País (como mostra a ilustração acima).
Por toda essa área de influência foi surgindo o que se chama em terminologia econômica, camadas intermediárias da população. Esse novo estrato social estava voltado ao negócio de abastecimento dos núcleos populacionais florescentes no sertão.
  Os proventos gerados pela mineração resultou no acúmulo de capitais e a formação de um novo e ávido mercado consumidor, insuflando o comércio. Que por sua vez,mais tarde possibilitou a expansão agrícola, como o florescimento do ciclo cafeeiro, entre inúmeras outras atividades econômicas, responsáveis, por consequência, pela geração dos recursos que vieram a financiar a industrialização paulista.
  Confirmou-se a máxima pela qual, para acasalar-se à terra, deitar raízes e florescer numa estável abundância, seria necessário anteriormente caminhar. Ou seja, "buscar remédio" sertão a fora.

Fonte: Essa série é uma compilação da coleção Terra Paulista - Histórias, Arte e Costumes (1º Vol.), que aborda a formação do Estado de São Paulo e seus habitantes. Outros dois volumes completam esse trabalho originalmente produzido pelo CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. ISBN 85.7060.295-2 (Imprensa Oficial do Estado)
                                        
O Brasil que falava nheengatu 

  Nota do Redator - A autêntica língua brasileira é o nheengatu ("fala boa"), que foi dominante no País por um largo tempo. No Brasil Colônia, era idioma corrente de brasileiros de todas as classes sociais, em uma área do País que ia de Santa Catarina ao Pará. O português só era falado pelos estrangeiros colonizadores, vindos da metrópole distante.

  O Nheengatu, um idioma puramente oral, é uma derivação da linguagem falada pelos índios tupi, mesclada com o português arcaico. Ele foi criado no século XVI pelos missionários jesuítas para atender as necessidades dos silvícolas, que tinham dificuldade em pronunciar muitas palavras portuguesas.
  Nossos antepassados brasileiros viviam muito bem com o nheengatu, mas a burocracia portuguesa que vinha ao País, não mais conseguia se comunicar com todos seus subordinados na língua materna. Sem dizer que aquele idioma interétnico atrapalhava os interesses colonizantes. Mais do isso, era preciso fazer algo para enfraquecer os tentáculos políticos dos jesuítas. Nos idos de 1758, por fim, seu uso foi proibido pela Coroa.
Indiazinha Karajá
Foto Giselle Varga
  Mas o veto não significou sua extinção. Quando aquela fala original brasileira foi banida das salas de aula, o povo transportou muito de seu vocabulário para o dialeto caipira (do tupi Ka’apir ou Kaa-pira, que significa “cortador de mato”, como eram chamados os colonizadores pelos índios) a nova forma de comunicação que ganhava força em parte da Nação.
 Sua lembrança mais viva está ali até hoje quando ouvimos alguém falar muié, poorta, zóio, tarrde, cuié, quintá, etc.
  
 Já vai longe o séc. XVIII, quando 2/3 dos paulistas falavam o nheengatu e o restante o português, sendo a maioria bilíngue.O tempo acabou por consolidar o português, mas o dialeto puro resiste em alguns rincões. Ele ainda é falado em certos pontos da fronteira com o Paraguai. Em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, a 860 quilômetros de Manaus, um ato do Executivo de 2002 tornou o nheengatu língua co-oficial do município, que é ensinado nas escolas.
  
 Como herança herdamos um falar todo especial, mais adocicado e de sonoridade agradável. No dia a dia do nosso português popular do Brasil, ainda estão vivas entre nós muitas palavras originais daquele longinquo idioma brasílico, como nhem-nhem-nhem, jururú, xará, bagunça, mingau e pindaíba, além de tantas outras.
 Postado por: Enéas M.F.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Da Natureza dos Homens


Reflexões especiais que oferece a boa leitura

  "O que foi feito no mundo é o que sempre foi feito, sempre será feito e está sendo feito agora em todos os lugares."

 Marco Aurélio, imperador romano e filósofo estóico.


"Se Deus não existe e a alma é mortal, então tudo é permitido." 

   Fiódor Dostoievski, escritor russo, em Irmãos Karamazov. 


A presença, para ser sentida, tem que ter alguma coisa de ausência."   

 Padre Vieira, escritor e pensador.


 "Of course you can't unfry an egg, but there is no law against thinking about it." ("Lógico que você não pode desfritar um ovo, mas não tem nenhuma lei contra pensar nisto") 

    Don Harold,  comediante norte-americano

Postado por: Enéas M.F.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Terra Paulista

Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret
- Quinta parte -

       A pé, em canoa ou no lombo da mula, cidades que caminham

   A saga das monções terminou na primeira metade dos anos 1700, com a abertura do caminho terrestre para a província de Guaiazes (Goiás), mais adequado e ameno. Sem dizer que ia-se no lombo de burros, que podiam ser vendidos ao final da viagem. Começava o ciclo do tropeirismo.

    A mula, animal híbrido, resultado do cruzamento do jumento com égua, povoava em abundância as campinas do Rio Grande do Sul. Aos poucos foi se apresentando como a melhor resposta às necessidades de movimentação de carga.

   Trazê-la dos pampas era, por si só, mais um desafio. Tratava-se de um percurso em torno de 1.500 km, na maior parte agradável, mas com alguns trechos de mata fechada, atoleiros e despenhadeiros, além dos ataques de saqueadores, índios e animais selvagens.

   Talvez mais do qualquer outro movimento, o tropeirismo era uma fonte segura e sistemática de negócios ao longo de seu traçado. E assim brotaram centenas de povoados fixos, tendo muitos deles virado cidades.

   Era um ótimo negócio, sobretudo aos donos de tropas,que se transformaram em ricos capitalistas, agraciados depois com títulos do Império. Como os barões de Antonina, de Iguape, dos Campos Gerais, entre outros.

   O enriquecimento era proporcional à exploração dos subalternos. Enquanto os donos das tropas ganhavam muito, os condutores, os camaradas, os cozinheiros, que formavam a massa dos peões, percebiam uma remuneração irrisória diante do trabalho e riscos envolvidos na empreitada.

   Para se ter uma idéia dos valores, uma cabeça de mula que custava entre um e dois mil réis na origem, era revendida por até 27 mil no fim da jornada, em Sorocaba. Deste total, três mil eram gastos com impostos, despesas menores e salários.



Fonte: Essa série é uma compilação da Coleção Terra Paulista - Histórias, Arte e Costumes (1º Vol.), que aborda a formação do Estado de São Paulo e seus habitantes. Outros dois volumes completam esse trabalho originalmente produzido pelo CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. ISBN 85.7060.295-2 (Imprensa Oficial do Estado)
 

(N. do R) - Pelos dividendos da indústria canavieira, o Nordeste foi o primeiro grande pólo econômico do Brasil, no alvorecer da colonização. Pernambuco e Bahia reuniam o maior número de engenhos, concentrados nas mãos de poucas famílias, que formavam a aristocracia canavieira, patriarcal por excelência. De meados do século XVI, estendendo-se por quase 200 anos, o País liderou a produção açucareira mundial, garantido-se, em parte, pelo monopólio português na Europa. No Velho Mundo, então,o açúcar deixava de ser uma especiaria de fins medicinais, para substituir o mel como adoçante, consumido em larga escala.

   Essa hegemonia começou a ruir a partir da metade do séc. XVII, com a entrada em concorrência dos produtos holandês e espanhol, vindos das Antilhas. Assim como pela difusão do açúcar de beterraba nas mesas européias, feito localmente. 

   Enquanto isto no Nordeste ocorria o esgotamento das terras férteis da Zona da Mata pela monocultura, elevando os custos operacionais dos engenhos. As florestas por sua vez foram queimadas nas fornalhas de cozimento da cana, esgotando a grande fonte energética conhecida. A atividade passou também a exigir investimentos ainda mais vultosos, assim como mão de obra escrava crescente. Isto e outros problemas estruturais precipitaram a decadência daquela era. 

  A riqueza começara a migrar e florescer no Centro-Sul, com a descoberta de jazidas minerais preciosas na região. Mais tarde, na segunda metade do séc. XIX foi a vez de São Paulo despontar na liderança econômica, com o surgimento de atividades perenes no campo e na indústria, onde foi investido o capital acumulado por séculos "buscando remédio" fora de casa.

Postado por: Enéas M.F.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

A Poética do Vale (III)‏

Litoral de Ubatuba em tempos idos

Na Rede

A rede vai, a rede vem...
E chora
e canta...

Cada gancho tem um ai
ai, ai, ai, ai
Pedro diz:
"De hora em hora,
Deus melhora."

 A rede vai, a rede vem...
Quem dera que fosse dizer uma fada:
"Veio morar no sítio Primavera,
há de chover farinha peneirada."  
 
Afonso Schimidt, Cubatão (1890-1964). Intelectual dinâmico, escritor e poeta parnasiano, participou do grupo de Monteiro Lobato. Foi também colaborador de diversas publicações regionais. 
 
Postado por: Enéas M.F.

domingo, 8 de maio de 2011

Terra Paulista‏

Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret

- Quarta parte -

Um rosário de privações em territórios desconhecidos

 
     Um novo desafio estava lançado aos paulistas. As grandes distâncias, os formidáveis obstáculos naturais e outros fatores, impediam as saídas clássicas das bandeiras para se atingir fronteiras desconhecidas, exigindo uma modalidade inédita de empreitada, navegando pelos rios.
  Teve início então ao período das monções, a marcha dos exploradores que ia pelos rios, saindo pelos lados de Itu e Porto Feliz, a partir do rio Tietê.
  Começava uma experiência com poucos paralelos na história do continente americano, pelo grau de audácia exigido para superar tantas dificuldades.
  Havia expedições de todos os portes, com meia dúzia de embarcações e outras com até 300 canoas, como a do capitão-general de São Paulo, Rodrigo Cezar de Meneses, de 1726.
  Essa seqüência penosa chegava a alcançar 3.504 quilômetros, percorridos em até seis meses. Compreendia os rios Tietê, Paraná, Pardo, Camapuã, Coxim, Taquari, Paraguai, Parrudos e Cuiabá. O que alguém descreveu apropriadamente como ”um rosário de martírios através do mar de sertão".
  E não era sem razão. As condições favoráveis acabavam no rio Paraná,no salto de Itapura (noroeste paulista) onde havia uma corrente era contrária, que tinha de ser vencida a remo. Em muitos trechos, principalmente os de corredeiras, seguia-se mesmo por terra, puxados por juntas de bois através de picadas, passando por febres,escassez de víveres, naufrágios, insetos, ataques de feras e de índios. Enfim toda a sorte de privações, o que tornava frequente a debandada de membros do grupo.

Fonte: Essa série é uma compilação da Coleção Terra Paulista - Histórias, Arte e Costumes (1º Vol.), que aborda a formação do Estado de São Paulo e seus habitantes. Outros dois volumes completam esse trabalho originalmente produzido pelo CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. ISBN 85.7060.295-2 (Imprensa Oficial do Estado)


N. do R. - Diferentemente do sudeste asiático, onde "monções" referia-se a um regime de ventos do verão, o termo foi adotado pelos bandeirantes para designar um período propício à navegação. Época esta de cheia dos rios, que criava condições favoráveis para as embarcações transporem obstáculos como pedras,corredeiras e pequenas quedas d'água. Evitava-se assim a estação da seca, quando a esses aventureiros obrigava a lombar as cargas e barcos por longos trechos de terra.
Cada expedição era formada por um comboio variável de batelões (canoas cavadas em troncos de árvores), transportando em media um total de cinco mil quilos em cargas, em expedições que duravam em torno de cinco meses. Carregava-se toda a sorte de utensílios à exploração das jazidas de ouro, assim como mercadorias para abastecer os povoados distantes.
 
Postado por: Enéas M.F.